A aplicação do princípio do crime impossível em delitos patrimoniais tem provocado discussões relevantes no âmbito jurídico. Neste caso, o desembargador Alexandre Victor de Carvalho ofereceu uma interpretação diferenciada ao absolver dois réus acusados de roubo, com base na impropriedade absoluta do objeto. O caso envolvia a subtração de uma carteira que, no momento da ação criminosa, encontrava-se vazia. Para ele, a ausência de lesividade ao bem jurídico tutelado, descaracteriza o tipo penal, tornando o fato atípico.
Segundo o desembargador, não houve sequer risco real de dano ao patrimônio da vítima, o que inviabiliza a caracterização do roubo como crime consumado. Entenda agora mesmo sobre o caso:
Roubo e crime impossível: ausência de lesividade anula o tipo penal
A tese de crime impossível sustentada pelo desembargador Alexandre Victor de Carvalho gira em torno da ideia de que, para haver crime de roubo, é necessário que o objeto da subtração seja, de fato, passível de causar prejuízo patrimonial. No caso concreto, os réus agiram com a intenção de subtrair dinheiro, mas a carteira levada estava completamente vazia. Diante disso, o magistrado argumentou que não houve risco concreto ao patrimônio, elemento essencial para a configuração do tipo penal.

Para o desembargador, não se pode presumir que a carteira conteria dinheiro, pois essa inferência seria meramente especulativa. O critério para se distinguir entre impropriedade absoluta e relativa do objeto deve ser objetivo, baseado em fatos concretos. Como não havia dinheiro, tampouco outro bem de valor, a tentativa de subtração revelou-se inócua, ausente de qualquer possibilidade de causar lesão ao bem jurídico. A ação, portanto, foi considerada atípica, com base no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal.
Divergência e condenação: voto médio mantém parte da pena
Apesar do voto técnico e detalhado do desembargador Alexandre Victor de Carvalho, prevaleceu no julgamento o entendimento da desembargadora, relatora para o acórdão. Em seu voto, ela discordou da tese do crime impossível, argumentando que a violência e a ameaça empregadas na subtração da carteira foram suficientes para caracterizar o delito de roubo, independentemente do valor do objeto. A magistrada destacou que a paz social foi abalada e que a ação dos réus causou temor na vítima.
O voto da desembargadora foi acompanhado pelo outro desembargador presente, que também entendeu que a carteira, mesmo vazia, era suficiente para configurar o crime. Ainda que não houvesse prejuízo econômico, a simples intenção de subtrair, associada ao uso de violência, já representaria ameaça ao patrimônio alheio. O resultado foi a manutenção da condenação do réu e a redução da pena de outro réu, tendo em vista os seus antecedentes e a aplicação proporcional da pena privativa de liberdade.
Princípio da insignificância e ponderação da resposta penal
O voto vencido do desembargador também abordou o princípio da insignificância como elemento suplementar à tese da atipicidade. Para o magistrado, mesmo que se entendesse haver alguma subtração patrimonial, o valor do bem – uma carteira vazia – seria ínfimo a ponto de justificar a intervenção mínima do Direito Penal. O magistrado reiterou que o Direito Penal deve se ater à proteção de bens jurídicos relevantes, não sendo legítimo punir condutas que, na prática, não causam qualquer dano mensurável.
A fundamentação apresentada pelo desembargador Alexandre Victor de Carvalho demonstra um compromisso com os princípios da legalidade, da lesividade e da intervenção mínima. Seu voto representou uma leitura garantista da Constituição Federal e das garantias processuais penais, ao enfatizar que o sistema de justiça criminal não deve se ocupar de condutas irrelevantes ou desprovidas de potencial ofensivo. Essa interpretação reforça a importância de se avaliar o conteúdo material da conduta.
O papel do desembargador na construção de um Direito Penal garantista
Em síntese, o julgamento desse caso evidenciou o posicionamento técnico e criterioso do desembargador Alexandre Victor de Carvalho em relação ao crime impossível. Mesmo vencido no colegiado, seu voto apresentou argumentos sólidos e inovadores, capazes de fomentar um debate relevante sobre os limites da tipicidade penal. Ao considerar a inexistência de risco ao bem jurídico como excludente da própria existência do crime, o magistrado reforçou a importância do princípio da lesividade no ordenamento jurídico.
Autor: Günther Ner